segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Pontualidade

A mulher negra, pobre, periférica, mãe de família, chefe de família, mil problemas com os filhos, mil problemas com casa, falta de dinheiro para alimentação, morando em contexto de muita violência, enfim, ganhando um salário mínimo que não dá para nada. Aí ela chega todo dia no trabalho antes do início oficial do seu trabalho, onde ocupa a posição mais dominada, como terceirizada da equipe de zeladoria. Chega 7h. Com pontualidade, regularidade, um proletária habituada aos regimes de opressão patronal. Calejada. Ela me diz que não pode perder o emprego, seria um caos perder o emprego, já passou por situações de desemprego. Aconteça o que acontecer, ela não falta. E ela me conta diversos casos gravíssimos que teve que ir trabalhar, deixando até filho à beira da morte, coisas assim. Pois, tirando essa mulher, as outras pessoas que compõem a mesma organização, em posições dominantes, dizem que é "impossível" chegar 8h no trabalho e se atrasam sistematicamente. Em geral, pessoas que vivem uma vida mais confortável do que da mulher que relatei e que não é uma, mas milhões. Já conversei com várias com o mesmo perfil. Por respeito a elas, faço de tudo para nunca chegar atrasado no trabalho. É o mínimo de respeito que elas merecem. Quando chego no trabalho às 7h20, elas já estão lá é arrumando tudo para as coisas funcionarem. Sou fã delas. E acho uma injustiça que elas ganhem tão pouco.

Retorno à década de 1980

Quem é trabalhador assalariado sabe que se não ceder às pressões de maior exploração vai dançar, vai rodar, sistema de opressão patronal virou uma faca no pescoço. Para quem ainda não caiu a ficha, é melhor ir saindo do mundo de fantasia, a exclusão vai aumentar e é muito e com muita força e intensidade. Ser muito explorado no trabalho vai ser o novo privilégio. Pode ser que a agora as críticas ao capitalismo possam se tornar mais populares. Espero que sim. Espero que tenha resposta coletiva como resistência. Mas a resposta coletiva vai depender da capacidade de proletarização de cada indivíduo. Quem se desproletarizar vai se lascar. A capacidade combativa da força de trabalho proletária é a base da luta política contra a exploração do sistema do capital. De minha parte, daqui por diante, só penso nessa luta, na luta proletária. Revolução social em tempos neoliberais. O ponto de vista do trabalhador e não o do consumidor da "nova classe média", essa sandice, terá de prevalecer como critério de ação coletiva. Tempos sombrios. Muita atenção é pouca. Me deixa perplexo que a esta altura do campeonato ainda muitos indivíduos estejam subjetivamente orientados pelas fantasias de grupo alimentadas pela "nova classe média" dilmista. Se naquele tempo, já ficava, imaginem hoje em dia. Morreu, pessoal. Não há mais como seguir o estilo consumidor competente "quem paga a conta não sei". A subvenção ao consumo foi apenas uma forma de clientelismo político que resultou em um alto preço a ser pago pelos direitos da coletividade, além da insustentabilidade econômica. Acabou. Agora é voltar para o estilo punk da economia de guerra da década de 1980. Pelo menos, a gente lia livros e ouvia música. Não vai sobrar pedra sobre pedra. Vai ser muita fome, adoecimento e morte. Uma tragédia pelos próximos 10 ou 20 anos.

Crianças não são a prioridade?

No Ceará, quase 30% das crianças vivem em redes familiares que estão na pobreza extrema. É uma taxa elevadíssima. Com a fragilização e precarização em andamento, que faz com que adultos se tornem mais indigentes, como ficará a vida dessas crianças, que já é um inaceitável inferno de privações e violências? O que os governantes estão propondo para solucionar isso? Que eu saiba, só estão pensando nos ricos. Por que as crianças não são a prioridade, mas sim os lucros dos acionistas das grandes empresas e da classe rentista?

Reforma da previdência 2019

Quer dizer que o crescimento econômico depende de uma perda de qualidade de vida da maioria? Para que serve então o crescimento econômico? Apenas para aumentar o capital dos muito ricos, mantendo empregos precários para a maioria sobreviver mal, agradecendo a Deus por não estar desempregado, nem doente, nem com o pé na cova? É esse o projeto oferecido? Isso lá é projeto coletivo. Isso é o crime. Querem nos fazer crer que empobrecer, adoecer e morrer é da nossa inteira responsabilidade individual, que não há responsabilidade coletiva sobre o destino subjetivo de cada indivíduo. É uma negação radical da solidariedade humana. Ocorre que não há produção de riqueza sem cooperação. A base cooperativa é essencial para a geração de riquezas, aí nesse ponto não é individual, a responsabilidade é coletiva, é de todos "irmanados" como "colaboradores". Isso lá é projeto coletivo. Isso é o crime. O problema é que o brasileiro não tem o hábito de guardar dinheiro? Gente, menos, por favor. Vejam a estrutura da renda no país antes de afirmar isso. São mais de 23 milhões na miséria, só para lembrar o básico. O benefício (BPC) da pessoa idosa pobre cai de 998 reais para 400 reais a partir de 60 anos. Só poderá receber 998 reais com 70 anos. Atualmente, a partir de 65, já recebe 998 reais. Dez anos (de 60 a 70), recebendo inicialmente 400 reais para chegar em 998 reais. Isso é justo? A pessoa idosa e pobre está sendo abandonada para o adoecimento e a morte prematuros. Isso é uma forma de produzir miséria e infelicidade para esses indivíduos e suas famílias. Tenho percebido que quem mais opina a favor da reforma da previdência é informal sem direito nenhum. Sabem "tudo" sobre direitos mas não tem direito algum. Acompanham algo como se fossem formais, mas estão fora daquilo que comentam. São pró-governo pois tanto faz, não são atingidos. São excluídos. Estranho, né? Habilidades sociais para se viver em condições precárias e instáveis serão cada vez mais requeridas. Os segmentos acostumados a condições mais confortáveis e que irão empobrecer precisarão aprender muitas coisas, se não se deixarem paralisar pelo intenso sofrimento social da queda.

domingo, 24 de fevereiro de 2019

Polarizações

Durante muitas décadas, vários trabalhos foram escritos para mostrar como Marx estava errado ao falar da tendência de polarização entre proletariado e burguesia, que isso era uma fantasia, que a realidade mostrara algo totalmente diferente (referiam-se ao capitalismo social de 1935-1975 em alguns países muito ricos). Agora, nos EUA e nos resto do mundo estamos assistindo desde 1991, pelo menos, uma crescente onda de empobrecimento relativo ao fosso da desigualdade. Usa-se a leve queda quase em ritmo estagnado da pobreza extrema como argumento de que vai tudo bem. De fato, o fenômeno da desigualdade é que permite analisar melhor essas relações. Não sou especialista no assunto, mas percebo um empobrecimento generalizado das classes médias que ao caírem empurram para baixo ou são suplantadas pelos "batalhadores" da classe trabalhadora. A polarização entre os muito ricos e a massa só aumenta, não?

A grande dívida

Em novembro de 2018, as grandes empresas deviam R$ 476,7 bilhões, BILHÕES, de reais à Previdência. Por que isso não entra na discussão da reforma da previdência? Por que essa dívida não é cobrada? Por que as grandes empresas não são sacrificadas para pagar essa dívida? Esse valor total da dívida é mais do que o dobro do chamado rombo da previdência que é a justificativa para a reforma que penaliza os mais fracos, divulgando ideologicamente que vai extinguir privilégios do funcionalismo de alta renda (e há sim distorções lá onde ninguém mexe, na nobreza do Estado - políticos, altas cúpulas do executivo, do legislativo e do judiciário, mas que não dá para generalizar para o todo). Uma manobra que o ressentimento de milhões está engolindo com a voracidade das emoções. Uma cegueira brutal. O desejo de nivelar tudo por baixo está gerando um efeito de desrealização geral. Os de baixo legitimando a generalização da política de empobrecimento, precarização, perdas, a que já estão submetidos, o que aumenta a desigualdade. Muitos trabalhadores do setor privado, vivendo em condições escorchantes, desejam de modo vingativo impor ao setor público que estejam em um mesmo patamar. Enquanto isso, as grandes empresas comemoram pela fragmentação política das camadas médias e do andar de baixo. Pois quase todos defendem o ponto de vista da grande acumulação de capital. A miséria exige ser ampliada. A riqueza agradece por ser ainda mais concentrada.

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Moral e cívica

Enquanto a esquerda parlamentar estiver nessa de querer fazer discursos moralmente edificantes, a gente não sai do canto. Esse lance de ser o formador das massas acaba com tudo. Que pretensão ridícula! Não há por que instituir de novo a Moral e Cívica, pois a esquerda parlamentar "socialista e radical" já faz esse papel em nome do Estado. Ridículo, por sinal.

A grande adesão

Se PSDB e PT não tivessem aderido com tanto entusiamo ao sistema de corrupção, chamado sistema político, não estaríamos aqui. Mas poderiam ter sido partidos no poder executivo do sistema do capital sem aderir a isso? Dificilmente. Do mesmo modo, o bolsonarismo está aí se estilhaçando em poucos dias. Não vai sobrar campanha sobre campanha. Afinal, a própria campanha já foi a adesão ao sistema de corrupção, apesar da multidão incrédula que a apoiou estar se debatendo histérica.

O imbróglio que não mais acaba

Os bolsonaristas estão tendo que usar os mesmos discursos dos petistas para poder dar sustentabilidade à imagem de seus líderes. O modo como se defende Lula e Bolsonaro segue as mesmas regras. É uma impressionante convergência de estratégias de manutenção de projetos de poder. Semelhanças demais no modo de agir, falar, justificar, proteger, atacar, desqualificar , jogar a sujeira para debaixo do tapete, etc. Essa articulação para prêmio Nobel da Paz para o Lula é uma romantização indevida, sou contra ele estar preso, mas acho pura mitificação. Parece que os governos dele foram santificados, não foram, foram de muita traição, de muita coalização com o que há de pior no sistema do capital. Romantizar Lula para atacar novo governo é a pior solução. Lula Livre, sou a favor de Lula livre, é a pior estratégia. Manter a mesma oposição que produz o atual governo. Negar a merda realizada para criticar a merda presente. Estou fora.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Torço contra

Torço para partidos de esquerda nunca mais ganharem para o poder executivo. Penso que isso seja uma condição histórica para a reconstituição do campo das esquerdas de luta. Enquanto houver governos das oligarquias, como no CE, dando emprego comissionado para quem usa retóricas de lutinha, não haverá luta. Tem de minguar. Não ter mais emprego para militância remunerada, aí vai esvaziar e vamos voltar ao que éramos, uns punhados de grupinhos espalhados por aí escondidos, invisíveis, mas muito atuantes do ponto de vista da educação política revolucionária. O consumo cultural como definição de ativista lascou tudo, partiu ao meio o que já era partido. O desejo de ser "nova classe média" foi um inimigo muito pior do que o da extrema-direita no poder.

O ovacionado

O que quase ninguém percebeu é que a opinião pública bolsonarista está interpretando completamente diferente os mesmos eventos. Como partem do familismo fundamentalista cristão, estão elogiando o modo como a família no governo é corporativamente unida na defesa do pai e, portanto, da autoridade da nação. Que isso é sinal de saúde. De família forte e saudável. Que também estão eliminando os elementos da velha política que estão tentando pegar carona no novo governo do novo Brasil. Bolsonaro e família estão sendo elogiadíssimos por milhões e milhões de pessoas. Mas não aqui na minha bolha na qual ele é retratado como se não houvesse milhões de pessoas acreditando muito nele. Do mesmo modo que há milhões que acreditam no Lula. Eu não acredito nem em um e nem em outro (nem no Ciro nem no Boulos nem no X ou Y). Estou fora dessa polarização. O sistema político é o sistema de corrupção do Estado do capital. É o demônio! Mas não acredito em Deus, nem no demônio. Aliás, só existe o demônio, isso tenho certeza absoluta.

Estou ligado, tá ligado?

As pessoas querem que a gente se cale, mas elas próprias não falam contra a hierarquia das falas que as (des)autorizam. Alguém tem de falar. Só acho que ninguém fala em nome de ninguém. Se ninguém fala em nome de ninguém, quem mantem o campo de fala vivo está no direito próprio a resistir para continuar a existir. Pelo direito de existir. Mas aí surge um problema. A tendência é que os que estão em melhores condições de existência estejam mais engajados a falar. A falar contra a ordem de silêncio e contra a ordem das falas. Mas e os que não estão em condições de falar? Seriam então reduzidos a uma condição que não passa de objeto de fala? Acho que não é bem assim. As condições podem ser péssimas, mas não anulam completamente a capacidade de falar. Mas fala por fala, percebo que os que pouco podem falar acabam representados por outros que falam e vendem suas falas para o sistema político (a diversidade de mercadorias humanas é aí comercializada com seus adereços e ornamentos). Esses que vendem suas falas, no mercado das falas que pretendem representar, dizem que apenas eles podem falar em nome dos supostamente sem fala que eles representam. Lutam pelo monopólio de falar em nome do "lugar de fala". Fazem um uso estratégico desta importante noção. Um uso retórico. Afastam aliados, dizem não precisar de ninguém, mas correm para os governos das oligarquias em busca de um carguinho. Vivem disso. Mas suas retóricas são virulentas e radicais. São figuras atravessadoras que neutralizam alianças políticas entre segmentos que possuem condições diferentes de classe, do ponto de vista da infraclasse dos que trabalham para viver do próprio salário. Desconvidam um monte de gente, mas não desconvidam "políticos profissionais" que vivem do sistema oligárquico do capital. Para estes, é só abraços e sorrisos e acessos abertos para falar com os "sem fala" que vendem no mercado de intermediações dos acessos. Se vendem para o governo, mas acusam outros de serem os aproveitadores. Estou ligado, tá ligado?

Setor de RH

Por que indivíduos que dizem representar o povo autenticamente, pois vieram do povo, usam a linguagem dos oligarcas em detrimento das linguagens que são contra-hegemônicas? Os autênticos representantes do povo que vieram do povo falam a linguagem do dominante na versão mais tosca. Em geral, é claro. Há algumas pouquíssimas exceções que confiram a regra. Mostram credenciais de povão e se vendem para o patrão governamental, pois o patrão é "socialista", é de luta! O que acontece ainda aqui no CE é o que restou do petismo em franca decadência. Um sistema de RH do sistema do capital, associado ao governo como balcão de negócios. Mas um monte de gente teve que migrar, pois o sistema agora tem seus próprios representantes autênticos do povo, os concorrentes que chegaram para tomar geral a máquina dos quartos, terceiros e segundos escalões. Sem cargo comissionado, não há partido. O partido é essa forma de traição, essa negociação subalterna, esse peleguismo básico, que, por vezes, late, mas não morde. Morde só quem está ao lado, mas não quem está acima. Enquanto as máquinas partidárias da esquerda oficial estiveram ainda no esquemão capacho-cargo comissionado, a gente não sai do canto.

Entre amigos e amigos

Chamam os amigos de inimigos mas quando se veem diante dos inimigos que consideram amigos pedem socorro, mas não antes de terem espinafrado os amigos como se fossem inimigos e bajulado os inimigos como se fossem amigos. É um enredo desesperador e constante que define hoje o campo "da luta", gerando mais e mais fragmentação e ódio interno ao campo. Um ódio autodestruidor que beneficia demais os amiguinhos lá do andar de cima, que todo mundo quer beijar e abraçar e tirar foto junto, pois são portadores de muitas oportunidades de remuneração comissionada no campo governamental do sistema oligárquico do capital. Coisas do Ceará, é claro. De uma esquerda que faz discurso ultra-radical e depois vai ouvir palestra do Senhor Doutor, tudo caladinho, parecendo um rebanho, sendo o próprio rebanho do Senhor Doutor do Governo. Toma benção do Doutor Oligarca e esculhamba os outros que nem são tão poderosos assim. Métricas de clientelismo em ação. Na avenida da universidade, a pessoa se descabela, parece que vai iniciar uma revolução. Nos escritórios do governo, nas reuniões, tudo asseadinho, com a melhor roupinha, batendo palminhas, sendo produtivos e proativos. Nos outros ambientes, onde deveriam ser produtivos e proativos, são anarquistas selvagens, não aceitam nenhuma autoridade. Mas depois ficam servindo de capacho, é só sair dos arredores da universidade. Por isso que ninguém acredita. Nem parece a mesma pessoa. É incrível. Chega a ser vexatório.

Letargia e mais letargia

O país entrou em total letargia, está aceitando tudo. O sonho da ordem realizado. O andar de cima está comemorando o silêncio e a adesão do andar de baixo. Ainda bem que estão quietos e ordeiros, diz o topo entre um uisquinho e outro.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Retóricas perdedoras ou vencedoras?

Em geral, as retóricas militantes radicais partem de indivíduos em ascensão social. Tenho percebido isso. Talvez, tenha uma relação com a variação da percepção da injustiça em função de uma expectativa de realização mais elevada. Os indivíduos com baixíssimas expectativas de realização, que estão em conformidade com o destino social que lhes é atribuído, tendem a ter uma percepção mais tolerante com a violência do sistema. Ter um lugar nomeado pelo sistema, nem que seja um lugar muito "simples", "humilde", pode ser um fonte poderosa de orgulho individual, mas pode ser também de vergonha. Uma vergonha que paralisa ou um orgulho que gera aceitação por ter um lugar na hierarquia. Afinal, quando há hierarquizações a regra é que aja alguém sempre abaixo que pode fazer com quem alguém se sinta acima. Alguém pode oprimir ou rir com menosprezo de alguém, esse é o segredo da dominação hierárquica. Dar a possibilidade de alguém humilhar o outro é uma função de ordem. Os militantes radicais com trajetórias de ascensão social para um tipo de "nova classe média" dilmista humilhavam de modo consciente ou não vários de seus pares, que se tornaram quase todos bolsonaristas.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

As coisas invertidas

No Brasil, os mais excluídos e com menos chances de adentrar nos mercados altamente competitivos, e que exigem pleno conhecimento incorporado da forma-empresa, defendem o capitalismo neoliberal desorganizado. Já os que estão incluídos, que sentem já na pele a desgraça que os outros desejam, pedem arrego, exigindo respeito aos direitos dos trabalhadores. A ideologia neoliberal virou coisa de pobre e o socialismo coisa de rico. Como fazer luta de classes assim?

terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

é o fim

é um gosto de nada na boca, uma vontade de sair correndo, fugir. as pessoas estão adoecendo, algumas morrendo, muitas apáticas. bate aquela sensação de que não dá para confiar nem na própria sombra. a própria ideia de ser gentil passa a ser parecida com a de ser otário. a pior canalha, a mais inescrupulosa, o rebotalho, está aí no altar. ninguém segura a mão de ninguém. essa é a dura verdade. pessoal finge apenas, ninguém vai lá perder tempo sendo solidário. é o fim. quando chamam alguém de amigo é para tirar algum benefício. não adianta fazer festa, a festa é da ordem da crueldade. não dá mais para dizer que está tudo bem. não está. a imposição do vazio não encontra mais tanta resistência. não haverá reconciliação. não haverá paz. uns tombam, outros morrem, muitos se ajoelham e pedem clemência.

domingo, 10 de fevereiro de 2019

Uma baita de uma enrascada

O pior é que o petismo não tem moral nenhuma para dizer que os outros estão enrolados. Zero moral. Nesse ponto, os bolsonaristas estão certos. Mas estão errados por acharem que o bolsonarismo não é um tipo de petismo com sinal trocado, com as mesmas práticas de clientelismo e corrupção, uns hipócritas. Por isso que enquanto ficar essa palhaçada entre petismo e bolsonarismo, incluindo o cirão das massas como variante acovardada do petismo, a gente não sai do canto. Tudo travado. O pior de tudo é o Boulos com esse lulismo oportunista que ele inventou e enterrou o psolismo junto. Só deserto. Só lasqueira. 20 anos nessa merda vai ser foda. Como dizia o poeta, é cada um por si e Deus contra todos. O Brasil "de bem" nos meteu numa enrascada sem tamanho!

Discurso de um cínico

Em geral, o que se chama "luta", "de luta", "movimento de luta", nos dias de hoje não faz nem cócegas no funcionamento brutal do sistema de dominação. A luta ou tem função festiva ou terapêutica ou as duas coisas ao mesmo tempo. Menos função de luta. Não sei por que ainda se chama luta, deveria assumir que é apenas autoajuda, estipulada para lidar com os sentimentos de impotência, isolamento e ressentimento. Luta que é luta gera efeitos de desestabilização, efeitos de desmantelamento, gera portanto forte repressão por parte do Estado. Sem falar que a forma-empresa tomou conta "da luta", esta está quase sempre orientada para e por um processo de capitalização eleitoral, as pessoas se vestem bem para participar dela. Lutas desde baixo e contra o Estado-capital viraram um slogan, uma publicidade bruxuleante. E lutas eleitorais viraram máquina de empregar militâncias remuneradas. Uma tristeza infinita parece restar com essas manifestações "de lutinha". Formas tímidas de aceitação do existente. Mas as retóricas são uma paixão, né? Sem retórica, não fica nada. Só o vazio da inação. Então, viva a luta! Avante! Observação: o cínico sou eu.

A favela paradoxal

Achar que não faz parte da favela é a maior ilusão. Seja favela como estigma ou como raiz da riqueza cultural e econômica. A favela é tratada como campo de extermínio pelo Estado. É produzida como campo de extermínio. Mas, ao mesmo tempo, a favela é quem sustenta a produtividade para garantir a vida rica das classes ociosas que mandam no Estado. A favela é alvo de uma política de morte. Mas a favela é a força de trabalho e de combate da nação. É a força que gera riqueza sendo excluída de seus benefícios. Gera riqueza para classes privilegiadas que se esmeram em manter a favela sob controle, seja com polícia, crime ou igreja. A favela é o Brasil. Mas nem todo Brasil está na favela. Mas a grande maioria está, mesmo quando não quer aceitar que está. Os conflitos sociais estão nas últimas décadas oscilando entre vergonha ou orgulho de ser favela, submissão à ordem senhorial ou insubmissão contra a casa-grande, contra a ordem escravocrata e colonial, que não sai de nós.