sexta-feira, 10 de maio de 2019

A representação da polícia

Ser de esquerda é querer ser representado por quem chama a polícia contra os movimentos? O próprio movimento elege a polícia como instância de organização da experiência nula. Que esquerda masoquista, hein? Que desejo de monarquia imperial stalinista, de ter um Grande Papai que cuide dos desamparados, abastecendo-os de modo clientelista e com paternalismo de abraços e sorrisos, de sentimentos e afetos. Pior do que o retrocesso do bolsonarismo é o retrocesso da esquerdinha desamparada, que se acerca do autoritarismo, acreditando que o autoritarismo é um traço apenas dos outros. Triste demais!

sexta-feira, 3 de maio de 2019

Compartilhar o infortúnio

Nós, humanos, acreditamos piamente que compartilhar com os outros nossos infortúnios é uma forma de mitigá-los. Por isso, não abrimos mão de relatar nossa infeliz existência uns para os outros. Sem falar que os mais infelizes costumam ser o que se obrigam a manter uma fachada de observância das convenções, mesmo quando o sujeito está em processo de franco desmoronamento.

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Ah, a universidade!

O uso de uma imagem negativada do campus universitário público como um lugar de devassidão moral tem sido a principal arma da restauração populista conservadora contra o sistema público de ensino superior. Difundem com rapidez e eficácia junto à população que a vida no campus é de orgia, drogas, desperdício de tempo e recursos. Mal sabem que as universidades públicas são organizações altamente hierarquizantes e disciplinadoras. Lugares de produtivismo do capitalismo universitário. São empresas no sentido neoliberal de produção de subjetividade que atue como capital humano. A universidade hoje é uma empresa que empresaria mão de obra para outras empresas, ensina a forma-empresa requerida pelas tendências neoliberais do capitalismo flexível. Como um lugar de produtivismo pode ser representado como lugar de desperdício e falta de normas? Um lugar hiper normatizado, normalizado, marcado pela lógica da concorrência e da rivalidade, um lugar "moderno", sendo representado como "primitivo". Que imagem estranha é essa de uma universidade de "liberação". É mais gaiola do que "liberação".

Ah, a sociologia!

Estava conversando com um bolsonarista, quando ele perguntou o que eu fazia. Eu disse que era sociólogo, professor de sociologia. Ele ficou inicialmente em silêncio. Aí, eu o provoquei. Parece que o presidente não gosta muito da sociologia, não é? Ao passo que ele me retrucou: "sim, pois vocês falam demais. Não deixam o homem trabalhar. Vocês atrapalham. Falam muito. Ele está fazendo o que tem de ser feito para melhorar". Meu interlocutor, no caso, é um homem do povo, trabalhador, evangélico, negro, pai de família, ex-lulista. O interessante é que no final da conversa que tive com ele, ele falava pelos cotovelos, expressava muito a opinião dele, altamente comunicativo, e me disse que tinha gostado de dialogar, pois sem diálogo não havia solução. É o que o Habermas chama de contradição performativa na teoria da ação comunicativa. Ele dizia que a gente falava demais, mas era ele quem falava demais. Dizia que a gente atrapalhava por querer dialogar, mas defendia o diálogo, contanto que fosse em concordância com o presidente da República, que estava no caminho certo. Interessante, né? Sociologicamente, interessante, quero dizer.