sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Falar onde começa o deserto

O importante é poder ter a liberdade de pregar no deserto. Poder falar para ninguém, se assim o desejar. Essa liberdade é imprescindível para a existência. Os mecanismos de controle da fala, as instâncias de controle da fala, usam os recursos do reconhecimento, ou seja, da luta pelo poder, afinal, acumular estima social, prestígio, ser visto publicamente, reconhecido, é a função da política. Não faz sentido usar no campo da política idiomas da ética, nem da amizade. Uma política da amizade é o que passa ao largo do campo do poder, da luta pelo poder político no sentido convencional. Os idiomas convencionais da política são tradicionais, conservadores, baseados em fundamentos de crença social, avessos à crítica e ao deslocamento, pois estes põem em xeque a ordem simbólica em que se baseia qualquer autoridade, seja ela qual for. Fazer política com argumentos conservadores é o pior desserviço, mas também o mais eficiente serviço no sentido de captação de votos. #NãoVaiTerVoto

O vocabulário anti-político da amizade.

Estou prestando atenção no tipo de vocabulário que as pessoas estão mobilizando para fazer campanha eleitoral: amigo, amizade, respeito, afeto, "me representa", "nos representa", carinho etc. O mais interessante é que as campanhas mais tradicionais, mais conservadoras, na história política do Brasil, sempre foram feitas com esse mesmo vocabulário. Não é interessante que o vocabulário tradicional, conservador, seja usado por frentes de esquerda? É sociologicamente muito interessante. Inclusive, surgiu uma nova estratégia retórica: os velhos e os novos, os que estão na luta há muito e os recém-chegados, sem história de luta. Existe violência simbólica maior do que esta? Afirmar o monopólio da luta nas mãos daqueles a quem se admira, a quem se tem respeito, é muito conservadorismo, não? Esse tipo de classificação é, além de muito Ancien Régime, estúpido por querer consagrar posição de poder por antiguidade, tudo aquilo que 1968 criticou, também esconde pretensões aristocráticas, pois apenas quem possui uma imagem aristocrática do mundo recorre à herança, ao patrimônio, ao legado, à antiguidade da cepa etc. É tudo ou desonesto demais ou inconsciente demais. Mas que uma campanha eleitoral se baseie na desonestidade, parece que é até aceitável pela maioria, todavia, se basear em inconscientes que escondem sentimentos de supremacia dos poucos e bons, aí é, sinceramente, muito ridículo. #NãoVaiTerVoto

Meus sentimentos de ralé

Que os filhos e as filhas do proletariado ou do precariado de ralé, sem pedigree, sejamos estúpidos, grosseiros e agressivos, é nossa posição subalterna na guerra entre riquinhos e pobres que nos joga em tal situação de refrega, abertamente belicosos, mas que os filhos e as filhas da burguesia os sejam, aí é sinal de que a decadência do "espírito" aristocrático desabou no chão da cozinha da senzala e se espatifou contra o muro da base, que não tem acesso ao caviar da estrutura de mando e poder. É o desentendimento, Rancière, a todo vapor.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Reprovações reiteradas

Uma das melhores coisas que aconteceu na minha vida foi ter sido reprovado reiteradas vezes em exames de aptidão para o exercício do mando. Não dispor, segundo os avaliadores, de estrutura subjetiva adequada, em conformidade com o ethos burguês do sucesso pelo sucesso, fez de mim um fracassado feliz. É muito importante fracassar na vida, quando se trata de se evitar tornar-se uma peça de uma estrutura de mando. Estou lendo Bukowski e relendo Bourdieu. Bukowski era um sociólogo incrível que se tornou um escritor de primeira e Bourdieu um literato medíocre que se tornou um sociólogo de primeira. Ambos nos forçam a pensar sobre as condições sociais e culturais do sucesso social na sociedade burguesa, e sobre as amarguras e sofrimentos sociais decorrentes da competição onde os competidores dominantes estabelecem as regras desde cima.

21 de julho de 2014

O que esta se passando em termos de repressão policial e perseguição governamental a opositores do regime é muito semelhante ao que se passou no período 1964-1968, com diferença que neste período houve uma escala mais considerável, e agora é menor a escala. Não sei se erro muito.