terça-feira, 20 de agosto de 2019

Rebaixamentos entre vergonha e orgulho

Nos últimos tempos, o rebaixamento de expectativas de realização foi a principal arma do sistema de opressão. Mas isso já é usual desde a segunda metade do século XIX, pelo menos. Contudo, houve uma novidade. Fazer com que o rebaixamento da expectativa de realização de sentido e valor seja celebrada pelo agente posto em subalternidade como motivo de orgulho. Ou seja, fazer com que pessoas se sintam realizadas na desrealização. Desde 2014, esse procedimento entrou em pane. O orgulho do subalterno na desrealização vivenciada como fantasia de sucesso foi quebrado. Voltou-se a outro modo de subjetivação no contexto da sujeição que faz com que as pessoas voltem a acreditar que cada qual deve estar no seu cada qual, cada um se realizando como pode, onde pode, onde é autorizado. A celebração do "eu sei o meu lugar" é um dos gozos mais estranhos, mas está em oposição ao outro gozo que projetava de modo fantasioso um lugar seu que não era o seu de fato nem de direito (na chave hegemônica). Entre vergonha e orgulho, as classes populares e as "classes médias" de ocasião mergulharam numa profunda queda em direção ao nada, do nada ao nada. O pior é que isso nem sempre tem servido como movimento de tomada de consciência da condição proletária, que é justamente marcada pela nadidade. O ser é o senhor. Os outros são o nada. O medo de tocar nesses assuntos delicados tem impedido a maior parte de intelectuais insurgentes de problematizar a situação contemporânea.

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